A degustação contou com a presença dos filhos e netos do escritor sanjoanense

O restaurante Tudo aos Molhos voltou a estar à frente de uma “revolução” gastronómica em S. João da Madeira.

Depois do impacto das Gastroformas, em parceria com a cake designer Andreia Costa, Jorge Batista voltou a arriscar e a estar um “prato” à frente do seu tempo.

Daqui em diante o arroz de miúdos tradicional, que terá como alternativa molho de francesinha, constará na carta do Tudo aos Molhos e será servido numa marmita tal e qual como era na época retratada no romance “Unhas Negras” de João da Silva Correia.

A degustação deu a provar um e outro prato, acompanhados do molete, um tipo de pão feito com pão de Ul, um bom vinho e, como sobremesa, arroz doce. Entre os convidados desta degustação, destaque para a presença de Gabriela Correia e Marçal Correia e Manuela Correia e Paulo Correia, filhos e netos do escritor sanjoanense, respetivamente.

“O vosso pai tem uma narração absolutamente fantástica” da época, das pessoas e das referências gastronómicas, destacou Jorge Batista, proprietário do Tudo aos Molhos, considerando que, “além do Mandarim, este livro deveria de ser de leitura obrigatória nas escolas”. “Um excerto rude, mas real da época”, descreveu Maria Clara Valente, amiga de Jorge Batista e dos familiares do escritor que mediou este encontro entre todos. “Só quem leu o livro sabe o que foi S. João da Madeira”, afirmou Maria Clara Valente, reforçando a ideia de que “o livro devia de ser de leitura obrigatória na escola”.

A época retratada pelo livro era “impressionante”, em que “primeiro comia o homem porque era quem trabalhava e precisava de mais força para continuar a sustentar a casa e só depois os outros”, recordou Manuela Correia. “Na escola, as pessoas abastadas levavam bananas e depois de as comerem colocavam as cascas no chão. Os outros pegavam nas cascas e raspavam o que sobrava. Era o possível para enganar a fome”, descreveu a neta de João da Silva Correia.

“O curioso deste prato é que há um aproveitamento de algo narrado no livro naquela época para a atualidade, tentando com isso criar um prato de época e que faça sentido na zona. Que eu saiba não existe nenhum prato que referencie a gastronomia de S. João da Madeira”, assumiu Paulo Correia.

A ideia é “vasculhar tudo e encontrar outras referências gastronómicas”, adiantou Jorge Batista que contou com a ajuda de Graça Oliveira, responsável da biblioteca municipal, para a pesquisa destas referências gastronómicas, com Pedro Vieira para a declamação dos excertos do livro durante a degustação e contará com Paulo Barreira, presidente da Associação Comercial, para conseguir levar esta ideia a outros comércios da cidade.

Um dos conceitos do Tudo aos Molhos é levar o molho de francesinha até onde nunca tinha sido feito e de agora em diante tem em mente um novo conceito que passa por servir todos os pratos de arroz em marmitas. E tem tudo para dar certo. Basta recordarmos a “revolução” gastronómica que provocou e pretende continuar a provocar com as Gastroformas que transformaram os sapatos, os lápis e os chapéus em comida e criaram aquelas que podem ser consideradas as primeiras referências gastronómicas de S. João da Madeira.

Por coincidência, o falecido João da Silva Correia foi homenageado a duplicar no fim de semana passado. Primeiro com a degustação do primeiro prato de gastronomia fabril inspirado no seu livro “Unhas Negras” pelo restaurante Tudo aos Molhos. Em segundo com o espetáculo “Unhas Negras”, projeto vencedor do Orçamento Participativo Municipal 2016 apresentado pela Associação É Bom Viver, que subiu no domingo ao palco da Casa da Criatividade.

DF

As recordações dos familiares de João da Silva Correia

“Entusiasmado e com curiosidade de ver a homenagem que é sempre agradável. Tudo que lembre o meu pai é sempre agradável. Não esperava este tipo de homenagem. A ideia é muito engraçada. Ele era muito carinhoso com filhos, com netos. E muito inteligente, não devia de dizer isto porque sou filho, mas era”, Marçal Correia, 87 anos.

“Achei uma maravilha este evento. Dos cinco livros que o paizinho escreveu, dois deles, não me lembro quais, foram escritos à mão do início até ao fim. Ele era tão natural. Era muito autêntico. E tinha as suas convicções muito bem vincadas. Por exemplo, lembro-me dele dizer: tirar apenas o que vai comer, não deitar comida para fora quando muita pessoa passava fome naquela época. Muito consciente. Não admitia a mentira nem a falta à palavra”, Gabriela Correia, 83 anos, a mais nova de cinco filhos, três já falecidos (Manuela, Helena e Simão).

Obras do escritor: as novelas Farândola e Porta Aberta e os romances Os Outros, Um Minuto de Silêncio e Unhas Negras

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