Pandemia faz disparar número de famílias em situação de emergência social
A pandemia continua a matar em Portugal e, ao que tudo indica, está para durar. Neste momento, o país encontra-se a três velocidades, com quase todo o território português em situação de alerta desde as 0h00 de ontem, quarta-feira, e a Área Metropolitana de Lisboa em estado de contingência, excetuando 19 das suas freguesias, que se mantêm em situação de calamidade. É na região de Lisboa e Vale do Tejo onde ultimamente se tem registado o maior número de surtos, levando as autoridades a tomar medidas excecionais.
O combate à propagação da Covid-19 prossegue, com uma vacina (e/ou um tratamento eficaz) ainda longe de ser uma realidade. Entretanto, os efeitos colaterais desta “guerra” contra um inimigo invisível, que dura há meses, já começam a sentir-se. Falamos concretamente do desemprego, da pobreza e da fome, que não param de crescer no país, à semelhança do que acontece no resto do mundo.
A crise pandémica está a fazer disparar o númerode famílias em situação de emergência social em Portugal. E S. João da Madeira (SJM) não é exceção. Neste concelho, desde meados de março, “registou-se um aumento de 88 novas famílias apoiadas [pelo Fundo de Emergência Social SJM Covid-19] até finais de abril e de mais 77 até ao final de maio”, perfazendo um total de 165 novos pedidos de ajuda à Rede Social de S. João da Madeira em cerca de três meses. Até então já eram apoiadas “cerca de 290” famílias.
Estes últimos dados foram avançados ao labor pela câmara municipal (CM) que, precisamente, “como resposta de emergência social à pandemia”, “criou o Fundo de Emergência Social com um reforço orçamental do Regulamento do Programa de Apoio às Famílias no valor de 50.000 euros, que permitiu o apoio a famílias afetadas pelas consequências socioeconómicas da Covid-19, não só pela redução ou ausência de rendimentos por razões de confinamento obrigatório, bem como por se encontrarem doentes”.
Segundo a vereadora da Ação Social, Inclusão e Habitação do Município, “este incremento nos apoios sociais permitiu apoiar mais famílias e, em simultâneo, acautelar outros apoios não previstos, como o pagamento de faturas referentes ao abastecimento de água e, em alguns casos devidamente fundamentados, ultrapassar o plafom anual previsto para estes apoios”. Ainda de acordo com Paula Gaio, “através deste Fundo de Emergência Social, foi possível reforçar o apoio às famílias em acompanhamento pelas entidades que constituem a rede de intervenção social direta em SJM. A saber, Segurança Social, Centro Comunitário Porta Aberta da Santa Casa da Misericórdia de S. João da Madeira, Centro Comunitário da Associação de Jovens Ecos Urbanos, Protocolo de RSI da ACAIS, bem como aqueles que prestam apoio alimentar e que são o Centro Humanitário da Cruz Vermelha de S. João da Madeira e a Conferência de S. Vicente de Paulo e S. José”. Todas estas instituições integram o Banco de Recursos da Rede Social coordenado pela autarquia, sendo que este é um grupo de trabalho que operacionaliza os apoios.
Mais medidas municipais de combate à crise socioeconómica causada pela pandemia
Para além disso, a CM, em parceria com a junta de freguesia (JF), implementou um serviço de entrega de refeições ao domicílio aos doentes sinalizados pelo Centro de Saúde ou por instituições com intervenção social no território, que tinham de estar em isolamento e não tinham familiares próximos, ou que estes estavam também na mesma situação de quarentena ou mesmo em isolamento, bem como aos idosos que frequentavam o Centro de Dia da Santa Casa da Misericórdia de S. João da Madeira que não tinham retaguarda familiar. Em simultâneo, a edilidade desenvolveu e criou um programa municipal de entregas ao domicílio que permite a entrega de compras e de medicação a pessoas idosas, pessoas inválidas ou doentes em isolamento ou quarentena. Para este efeito, foi criada uma linha telefónica e equipas de funcionários camarários, em colaboração com a JF, para proceder ao atendimento telefónico, registo dos pedidos e entrega de refeições, compras e medicação.
Paralelamente, o Município ainda criou mais duas linhas telefónicas, uma de apoio psicológico e outra de apoio ao isolamento, no sentido de providenciar apoio ao público que dele necessitasse.
Já foram gastos mais de 31 mil euros no apoio a famílias
Este tema viria a ser também aflorado na última reunião de câmara. A vereadora da Ação Social, Inclusão e Habitação fez saber aos presentes quanto foi gasto até ao momento no apoio a famílias sanjoanenses em situação de emergência social.
Contas feitas por alto, já foram usados mais de 31 mil euros do valor disponibilizado pelo Município para acorrer aos novos pedidos de ajuda que foram feitos desde março, altura em que a pandemia atingiu o nosso país.
Recorde-se que, como medidas excecionais de combate ao novo coronavírus, a câmara criou o Fundo de Emergência Social (FES) SJM Covid-19 com um reforço orçamental do Regulamento do Programa de Apoio às Famílias no valor de 50.000 euros e ainda uma linha de quatro mil euros mensais para bens de primeira necessidade e produtos higiene, gerida pelas instituições que integram a Rede Social.
Segundo Paula Gaio especificou, precisamente em março e no que diz respeito ao FES, foram utilizados 4.275,23 euros; em abril 4.327, 71 euros; em maio 6.119,93 euros e em junho 9.590,14 euros.Isto, em “pagamentos pontuais de rendas, luz, água, gás, saúde”, etc..
Já no que concerne à dita linha de quatro mil euros, houve “em março um gasto 1.211,24 euros, em abril 468,33 euros (houve aqui um reforço e temos de agradecer aos hipermercados colaboraram com donativos), em maio 3.089, 29 euros e em junho 2.141,70 euros”.
Ainda a propósito, o presidente Jorge Sequeira assegurou que “estamos a cobrir todas necessidades que chegam dentro das medidas que foram aplicadas”, não tendo sido esgotados ainda os planfons, quer da linha de apoio adicional, quer do FES.
Centro Comunitário Porta Aberta
Pedidos de bens de primeira necessidade aumentam em cerca de 50%
Sendo uma resposta social de intervenção comunitária da Santa Casa da Misericórdia de S. João da Madeira, o Centro Comunitário Porta Aberta encontra-se “numa posição de primeira linha na deteção e no socorro social aos mais afetados pela Covid-19 no concelho”. Segundo Sara Ribeiro, psicóloga, uma primeira consequência da pandemia e da quebra de rendimentos das famílias – e, porventura, aquela com maior visibilidade presentemente – foi o aumento da solicitação de bens de primeira necessidade em cerca de 50% face à frequência de 2019.
Este ano, de acordo com a também técnica gestora de processos, o Centro Comunitário Porta Aberta apoia 195 beneficiários do “Programa Operacional de Apoio às Pessoas Mais Carenciadas” (POAPMC), número que em agosto crescerá para 260. Para além disso, “servimos 7.734 refeições pela Cantina Social até abril de 2020 (um crescimento de 66% face às 4.655 refeições servidas no 1.º quadrimestre de 2019) e fizemos 155 entregas de alimentos até maio último, ajudando 105 agregados familiares (com 270 indivíduos), considerando apenas as entregas de ‘quebras’ doadas por superfícies comerciais”. Note-se que no caso do POAPMC, conforme explicou Sara Ribeiro, a Misericórdia é entidade mediadora pelo que encaminha ajudas para utentes acompanhados por outras associações concelhias de intervenção social.
Ainda em declarações ao labor, a responsável disse que, para garantir todos estes apoios, “impõe-se sublinhar a sensibilidade das instituições parceiras: o Centro Distrital de Aveiro do Instituto de Segurança Social IP, porque aceitou aumentar a frequência comparticipada da Cantina Social de 28 para 48 refeições/dia; o POAPMC pelo aumento do número de beneficiários que permitiu; a câmara municipal, porque aceitou comparticipar as refeições servidas para além do referido protocolo com a Segurança Social, garantindo que ninguém fica a descoberto; a Mercadona, o Continente e o Lidl, pela assídua doação de bens para distribuição”.
Para Sara Ribeiro, “a realidade vivenciada terá impactos a médio prazo hoje imperscrutáveis pelo que não é possível estimar o tempo de permanência deste volume de apoios”. De qualquer modo, e como garantiu ao nosso jornal, “o acesso à alimentação é a expressão de um direito básico que pugnaremos por salvaguardar comprometendo nessa tarefa o saber técnico da equipa do Centro Comunitário e o exercício da própria missão da Misericórdia”.
Centro Comunitário Ecos Urbanos acompanha mais 40 novos casos
Nos meses de março e de abril, o Centro Comunitário Ecos Urbanos registou 27 novas situações, sendo que cinco destas “já tinham processo nos Ecos Urbanos, mas não estavam em acompanhamento”. Ou seja, trata-se de “situações que se agudizaram”. Entretanto, e isto até 12 de maio (data do último levantamento), houve mais 13 pedidos de ajuda. Contas feitas, o Centro Comunitário passou a acompanhar mais 40 novos casos,maioritariamente de tipologia familiar nuclear com filhos, num total de 79 pessoas.
Para a presidente da direção da Associação de Jovens Ecos Urbanos, estes números são representativos do impacto que a Covid-19 teve na economia dos agregados sanjoanenses, com todas as implicações pessoais e sociais que daí advêm. Segundo Rita Pereira, a associação “aumentou em muito os apoios prestados, não só devido a estas novas situações, como ao agudizar de situações que já acompanhávamos”.
“Houve, aliás, um investimento muito grande da associação, sobretudo na aquisição de bens alimentares, e o apoio atribuído pela autarquia foi essencial para que ninguém ficasse para trás”, salientou a dirigente, destacando ainda o envolvimento da comunidade. Como disse, “vários privados apoiaram, sobretudo com géneros alimentares, o que se revelou importantíssimo para a prossecução da nossa missão”.
Mas atenção que, de acordo com Rita Pereira, “o nosso trabalho ainda agora começou”. Em seu entender, “será necessário mais trabalho para que se voltem a autonomizar”.