O próximo ano será duro e trará inúmeros desafios. É a crise sanitária que colocará enorme pressão sobre o Serviço Nacional de Saúde, é a crise económica que atingirá o emprego e é a consequente crise social, a que existe sempre que alguém perde os seus rendimentos.
Sabemos de antemão que tudo isto será realidade no próximo ano. E sabemo-lo porque todas estas crises já estão em desenvolvimento agora, durante o ano de 2020: o SNS já está em dificuldades em algumas zonas do país, os despedimentos coletivos já atingiram o máximo desde 2014 (e os abusos laborais grassam como há muito não se via) e o desemprego e a pobreza instalaram-se nas casas de milhares de famílias.
Sabendo tudo isto sobre o presente e sobre o futuro imediato, o que se exige é que um Orçamento do Estado para 2021 seja capaz de responder à crise. O que se exige é que o Orçamento do Estado para o próximo ano seja capaz de dar ao SNS os recursos necessários para responder a todos os utentes; seja capaz de proteger o emprego e limitar o abuso laboral; seja capaz de fazer com que nenhuma família caia abaixo do limiar de pobreza.
O Orçamento que o Governo do Partido Socialista apresentou não é capaz de fazer nada disto. Não responde à crise que todos sabemos que existirá no próximo ano e, por isso, não serve ao país.
Vejamos, ponto por ponto:
O SNS terá de responder à pandemia (que cresce), mas terá também de manter a atividade programada (porque as situações não Covid não podem ficar sem resposta) e de recuperar os milhões de consultas, cirurgias e exames que foram suspensos. Que propõe o Governo no Orçamento que apresentou à Assembleia da República? Um aumento de 0,03% das transferências para o SNS. Ninguém acredita que estes 0,03% sejam tudo o que o SNS precisa. Ninguém a começar pelos próprios profissionais de saúde que dizem que é preciso um aumento substancial de orçamento, investimento e contratações e que isso deve acontecer já.
Sobre proteção do emprego: perante um ano que possa ser de destruição de muitos milhares de postos de trabalho, o Bloco de Esquerda propôs a proibição de despedimentos em empresas com lucros e a reposição da indemnização por despedimentos que vigorava antes da troika. A razão é simples: não se pode permitir que alguns utilizem a crise como desculpa para despedir e o objetivo do Governo deveria ser proteger os mais frágeis. Acontece que o Governo do PS rejeitou todas essas propostas. A opção é clara: no código laboral não se mexe e as regras da troika para facilitar despedimentos são para manter.
Sobre a proteção dos mais vulneráveis, o Bloco de Esquerda propôs a criação de uma nova prestação social que não deixasse ninguém abaixo do limiar de pobreza. Ela destinar-se-ia a quem é mais vulnerável em qualquer crise: recibos verdes, trabalhadores que não têm descontos suficientes para aceder ao subsídio de desemprego, trabalhadores informais que estão completamente desprotegidos, trabalhadores que ficaram sem apoio no desemprego. O que contrapropôs o Governo? Em vez de uma nova prestação social, um apoio excecional muito limitado no tempo; em vez de uma resposta para todas as pessoas em situação mais vulnerável, imposição de condições que deixam sempre centenas de milhares de fora. Neste Orçamento o Governo está mais preocupado com a chamada ‘despesa estrutural’ do que com a crise social.
É uma irresponsabilidade saber que 2021 será um ano de crise e não apresentar um Orçamento que responda a essa crise. Uma irresponsabilidade que se poderá pagar caro: com a fragilização do SNS, com o aumento do desemprego e com a condenação de milhares de famílias à pobreza.
Já se sabe que a Direita não é alternativa neste debate. Essa Direita é aquela com quem o PS se levanta para impedir mudanças no código do trabalho ou para injetar centenas de milhões de euros em bancos levados à falência pela corrupção. A alternativa terá, por isso, que ser encontrada à Esquerda. Se o PS desistiu de responder ao país e apresenta um Orçamento medíocre, se a Direita não conta para o que é necessário, então será à Esquerda que a alternativa se construirá. O Bloco de Esquerda está e estará cá para isso. Porque é possível responder à crise de outra forma.