Os deputados Moisés Ferreira e Nelson Peralta, eleitos do Bloco de Esquerda (BE) pelo distrito de Aveiro para a Assembleia da República, e as cidadãs Ana Couto e Luísa Ramalho acusam a câmara municipal de não cumprir com a promessa de deixar de usar glifosato, um herbicida considerado perigoso, para acabar com as ervas daninhas nas ruas e nos espaços públicos em S. João da Madeira, prejudicando assim a saúde da população e dos animais.
O assunto foi abordado durante uma conferência de imprensa realizada esta segunda-feira de manhã na Praça da República, em Fundo de Vila, local onde alegadamente terá sido aplicado um herbicida com glifosato, no passado dia 12 de janeiro, pelas 0h00, sem aviso prévio.
Os avisos colocados pela empresa SUMA foram alvo de muitas críticas. Seja pela forma de divulgação da desinfestação através da colocação do aviso em árvores e em postes de iluminação em vez de locais com maior visibilidade para todos os cidadãos como a entrada dos prédios; seja pela informação escrita não ser percetível quanto ao herbicida usado e não ser específica quanto ao local onde foi aplicado. Mas as críticas não ficam por aqui. O aviso da desinfestação é confuso em relação à data em que foi validado pela empresa responsável pela limpeza urbana no concelho. O labor teve acesso a um dos avisos, cedido por uma das cidadãs, que tinha como data de validação 11 de janeiro, um dia antes da intervenção, mas depois substituíram por 13, um dia depois da ação.
Os deputados e as cidadãs questionam ainda a legalidade da aplicação deste herbicida numa praça com espaço de convívio uma vez que o Decreto-Lei n.º35/2017 determina a proibição de tratamentos fitossanitários com recurso a produtos fitofarmacêuticos em jardins, parques urbanos de proximidade, entre outros.
“Acho que isto não é um caso excecional. Passou a ser rotina”
“Aqui colocaram o aviso um dia depois de colocarem o glifosato. Tenho muitas dúvidas que possa ser usado nesta zona devido à interdição do seu uso em espaços de usufruto coletivo”, disse Moisés Ferreira. Como frequenta todos os dias a Praça da República, Ana Couto procurou saber qual o herbicida usado pela SUMA, ficando a saber através de um dos funcionários da empresa que foi Montana Sapec, afirmou aos jornalistas, dando a saber que depois de questionar a câmara sobre o assunto ainda não recebeu uma resposta.
O uso do glifosato também foi levado à câmara municipal pela cidadã Luísa Ramalho através de email enviado em dezembro de 2017, ao qual o presidente Jorge Sequeira respondeu em janeiro de 2018 com a informação de que a sua utilização tinha sido “renovada por cinco anos nos países da União Europeia”, assegurando que o mesmo só seria usado “em casos excecionais”. Uma garantia que não convence a cidadã devido a episódios como o da Praça da República. “Acho que isto não é um caso excecional. Passou a ser rotina”, afirmou Luísa Ramalho, considerando que o “mais grave” é que “deixaram de fazer durante o dia para fazer durante a noite”, o que “não me parece muito correto”.
Por sua vez, Nelson Peralta, responsável pela pasta do ambiente e pelos projetos de lei relacionados com glifosato, relembrou que o BE foi o primeiro partido a apresentar ao Parlamento uma proposta que proibia o uso de glifosato no espaço público. Apesar de não ter sido aprovado, o partido continua a lutar contra o uso deste que está “provado ser um produto cancerígeno” e que segundo o estudo da Associação Transgénicos Fora, realizado em 2018, estava presente no corpo de todos os portugueses testados.
Os dados deste estudo provocaram “uma onda de protestos e indignação no país”, levando a que muitos autarcas anunciassem que iam substituir o glifosato por outros meios alternativos térmicos ou de monda diferente de água com outros produtos, recordou Nelson Peralta, garantindo que esses são igualmente eficazes.
O Bloco vai questionar a Direção-Geral de Agricultura e Veterinária (DGAV) sobre a ação levada a cabo em S. João da Madeira. Também vai indagar a câmara municipal sanjoanense sobre quando vai honrar a promessa de deixar de usar glifosato.
SUMA garante à câmara que não usou herbicida perigoso
A Câmara Municipal de S. João da Madeira é informada previamente do plano de intervenção a ser realizado e, por norma, a população é avisada com uma antecedência de 24 horas, respondeu a própria, através do seu gabinete de comunicação, depois de questionada pelo labor sobre se tinha conhecimento da aplicação de herbicida para controlo de infestantes realizada no passado dia 12 de janeiro na Praça da República.
Acerca desta intervenção em que alegadamente terá sido usado o herbicida Montana Sapec, um concentrado de glifosato, “a empresa prestadora do serviço de limpeza urbana garante à câmara que não utiliza esse tipo de herbicidas e que não o fez no caso concreto referido”.
Em relação ao eventual pedido de autorização para usar determinados herbicidas em determinados locais, o Município esclareceu que “os produtos utilizados são todos alvo de autorização por parte da DGAV, mediante pedido da empresa prestadora de serviço”.
Já a confusão gerada pela informação publicada nos avisos sobre a ação de desinfestação levou a que seja alterado o procedimento. “Perante as dúvidas surgidas relativamente à colocação desses avisos, a empresa assumiu perante a câmara municipal que irá alterar o procedimento a esse nível, para evitar eventuais situações equívocas na informação das datas, locais e produtos relativos a cada intervenção”.
“Têm sido testados e aplicados meios mecânicos e produtos biológicos”
Ao nosso jornal o Município afiançou que o uso de meios alternativos em vez do glifosato é uma meta que pretende cumprir. “A substituição gradual, em S. João da Madeira, desse tipo de monda química, que continua a ser usada em muitos municípios do país, é um objetivo assumido pelo Município, na linha do que já foi possível alcançar noutras áreas, como na retirada do amianto de todos os edifícios escolares da responsabilidade da câmara”.
No processo de concretização deste objetivo, “têm sido testados e aplicados meios mecânicos e produtos biológicos”. Contudo, os meios alternativos “são menos eficazes”, afirmou o Município ao labor.