Folha de calendário há muito rasgada renasce na cor dourada das uvas e das maçãs no ar que arrefece. Nostalgia das noites longas e do sol que cedo se deita e tarde amanhece.
Água das fontes em rios que correm e sobe às estrelas em nuvens à solta que a trazem de volta nas gotas da chuva.
Roda o tempo que não dá tempo de agarrar a vida. Semeia e colhe nos campos lavrados. Agora vazios.
Cortam os pássaros o ar morno em voos rasantes, restos de acaso no bico, sem ninhos de amantes.
O tractor deixa bem longe o chiar do carro de bois vergado ao peso das dornas e dos cestos das uvas.
As folhas vermelhas das vides tintas entrelaçam-se no amarelo das brancas ao longo das ramadas quase depenadas.
Os castanheiros nas copas ondulantes mostram o verde ainda tenro dos ouriços, e no quintal de cima o loureiro, sempre verde, acena ao deus Apolo com uma vénia à música e à poesia.
Grasnam patos no tanque lodoso e as ovelhas regressam sozinhas ao curral.
Uma neblina ténue envolve a lua que cedo desponta e desce da serra a acariciar o vale.
Voltou o Outono que o tempo levou. Só o tiquetaque do relógio, no silêncio do tempo, levou a folha de calendário que passou.